Voltava da fábrica de tecidos todos os dias pelo mesmo
caminho.
Ele a esperava na calçada e repetia: oh mulata, ainda serás
minha!
Ela sorria num ar de deboche, quem sabe provocação, e respondia:
português atrevido!
Ela de finos traços, olhos verdes, neta de um ventre livre e
de um francês que se encantou com a negritude da Margarida.
Da fábrica de tecidos para os braços do português ... um,
dois, três ... nasceu uma branca como a neve, cabelos castanhos claros e finos.
Portuguesinha, diziam.
Coisas que só as leis das probabilidades aplicadas à
genética poderiam explicar.
Não foram felizes para sempre.
O português, cansou-se do exótico e partiu.
Elas, sozinhas, sobreviveram na simplicidade da vida.
Quatorze anos se passaram e quase portuguesinha precisou
trabalhar.
Documentos a recolher, descobriu que não tinha sido
registrada.
Ah, o português? Casara-se com uma branca e tinha muitos
filhos.
Restou à mulata de olhos verdes registrar sua filha sem pai.
No cartório, preto no branco, a certidão de nascimento da “branca
como a neve”, quase portuguesinha empardeceu.
Coloriu sua vida independente dos que tentaram empalidecê-la.
©rosangelaSgoldoni
02 05 2019
RL T 6 637 796
Bem de acordo com a realidade, muito bom.
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